
Até há pouco tempo, apenas as viagens permitiam conhecer os usos e costumes de outros locais distantes e diferentes; só os ricos (com todo o conforto) e os aventureiros (mesmo sem ele) podiam viver aquelas experiências que o comum dos mortais lia em livros ou, mais recentemente, via na televisão.
Como se comportam aquelas pessoas? Quais os seus sonhos? São parecidas connosco? Quem regressava, contava histórias de amizades tão estranhas que só aquela deslocação permitira. Ter um amigo assim, escrever-lhe e saber com o atraso do correio que lhe tinha nascido uma filha ou falecera algum parente, só acontecia a uns poucos.
A internet veio-nos permitir contactar com pessoas com quem estaríamos destinados a não nos cruzar. Na verdade, a internet permite-nos conhecer pessoas com quem não nos cruzamos, no sentido estrito do termo. Primeiro, veio o correio electrónico, mas não se ia além de conhecidos ou colegas; não há listas de endereços pessoais, nem nos atreveríamos a escrever a pessoas que não conhecíamos, tal como não telefonamos a alguém só porque tem o nome na lista telefónica, ou vamos a casa de alguém só porque a sua casa tem uma porta com campainha.
Mas agora temos o hi5, as hp (homepage) e o msn. Agora temos os programas de chat, mais ou menos sofisticados. Se eu passear na net e encontrar uma pessoa que tenha uma hp, sinto-me à vontade para lhe mandar um email ou deixar uma mensagem. Ao colocar na net informações sobre a sua vida e os seus gostos, essa pessoa mostra-se disponível para falar sobre si no que concerne aos assuntos expostos. Então, se eu lhe enviar um comentário, ela pode ou não responder, mas há um novo canal aberto. Se eu aderir a um programa de chat ou a um grupo de discussão, o meu leque de contactos é agora maior e mais diversificado do que alguma vez foi. Encontro aí pessoas que, de algum modo, têm interesses em comum comigo.
Entretanto, convém ter à mão aqueles amigos standard de ao pé da porta, que nos vão ajudar em momentos de aflição. Pareço muito cínica?? Hehe, ando a aprender umas coisas na net… ;)
Apesar dos meus bastantes anos, ainda não perdi o feitio (ia escrever defeito, mas não é) de ser curiosa e querer saber o que se passa. As pessoas, mais do que os lugares, sempre me fascinaram. E a net é uma bela tentação. Deste modo, acabei conhecendo gente muito interessante, e ao fim de algum tempo, aqueles a quem o programa chama buddies, acabaram sendo amigos. E eu acabei por perceber que tinha completamente redefinido o meu conceito de amizade.
Tenho, como todos os afortunados, amigos que me ajudaram em momentos difíceis e riram comigo em momentos felizes. Que os amigos não se vêem só, como diz o ditado, nas cadeias e nos hospitais. Eu tenho amigos desses, que me ouvem e me aconselham, e que, por amizade, me contam os seus problemas e as suas alegrias, pedem o meu conselho ou a minha opinião. Amigos que eu posso sentir e abraçar.
Mas agora, tenho também amigos dos outros. Que nunca vi a não ser num retrato (ou apenas imagino), mas com quem falo da vida. E com esta minha curiosidade de saber como vivem e sentem pessoas distantes, acabámos trocando opiniões e por vezes confidências. Que é muito difícil saber onde termina uma e começa a outra. É verdade que, longe do que eu sempre considerei importante, não falo com eles olhos nos olhos. E o pior é que nem falamos, apenas escrevemos. Felizmente agora temos os ícones expressivos :), e com eles damos cor às palavras. Assim, com textos simples e muitas abreviaturas (que as conversas querem-se dinâmicas) expressamos opiniões, sentimentos, solidariedade.
E porque chamamos a estas pessoas amigos virtuais? O que é virtual aqui, as pessoas ou as amizades? Quando, numa tarde quente de domingo, me sinto aborrecida e sem vontade de sair para o calor abrasador lá de fora, quando as praias e as ruas estão apinhadas de gente barulhenta, quanto mais agradável não é sentar-me em frente ao meu pc e conversar, literalmente, com um desses meus amigos. Trocar opiniões sobre o que se passa no mundo, nos nossos países, falar sobre os filmes que vimos ou os livros que lemos, trocar músicas e vídeos do Youtube. A conversa pode ser simples, séria ou divertida. Ou, ao longo de uma hora ou mais, pode ser tudo isso. Tal como seria aquela conversa na esplanada com uma das minhas melhores amigas não-virtuais.
O principal defeito apontado a estes relacionamentos é exactamente o facto de não ser possível confirmar a identidade da pessoa que está do outro lado, o seu aspecto e, sobretudo, se é o que diz ser. Mas, na realidade, até que ponto conhecemos nós as pessoas com quem nos damos pessoalmente? Até que ponto não representam elas para nós o papel que mais se adapta ao nosso caso? Até que ponto não se sentem algumas impelidas a tratar-nos com uma faceta mais maternal/paternal ou, pelo contrário, como filhos pedindo a nossa aprovação? Se num relacionamento normal fazemos muitas vezes ambos os papéis, dependendo das ocasiões, o mesmo se passa com os amigos virtuais.
Dizia-me ontem um amigo meu que, depois de conhecer pessoalmente gente de vários países, compreendeu que somos todos basicamente iguais. Sim, somos, chego também eu à mesma conclusão. Somos mais parecidos do que chegamos a pensar, quando vemos nas notícias identificar um país através de determinadas características. Mas também somos suficientemente diferentes para tornar interessante a troca de experiências e opiniões.
Tenho alguns, poucos, desses amigos virtuais. Com quem troco ideias, e de quem recebo informações sobre as suas vidas e os seus países. Têm estas amizades características comuns às outras: quando eu fico em casa constipada ou desabafo sobre o que me preocupa, tenho no dia seguinte uma mensagem a perguntar se estou melhor. Escusado será dizer que eu procedo do mesmo modo com eles. E a verdade é que sabe bem termos quem se preocupe connosco, mesmo com a certeza de que essa pessoa está do outro lado do mundo e não nos pode vir ajudar num momento de aflição.
É um facto que é muito mais fácil desaparecerem das nossas vidas, basta cortarem-nos do messenger; e com certeza deixarão um vazio. Mas na verdade, quantas vezes isso não nos aconteceu com pessoas de quem gostámos e que um dia se mudaram, e nunca mais as vimos? Pessoas que num momento foram tão importantes nas nossas vidas, a ponto de pensarmos que não poderíamos viver sem elas? Que nos deixaram boas recordações, que agora não passam disso mesmo?…
Pela net, entraram na minha vida pessoas que nunca teria conhecido, ainda que vivessem na mesma cidade. Estou tão feliz por isso ter acontecido, que não resisti a partilhá-lo.
Como dizia um desses meus amigos virtuais, as nossas conversas são heart2heart. =D
5 comentários:
lerslemrCuriosamente, ainda hoje à tarde pensei num amigo que conheci, através da net há dois anos,tendo-lhe mandado uma sms. No verão de 2006 fiz uma página no h5, influenciada por uma amiga e, adorei a experiência, no entanto 4 meses depois, fiz o que referiste - apaguei-os da minha vida, assim como a página. Hoje pensei voltar a fazer tudo de novo! Como vês, nada acontece por acaso. Quanto à nossa forma de escrita ser parecida, é verdade e foi por essa razão que me foi tão defícil expressar-me quando li aquele teu texto. Este último é diferente, mas o que escrevemos e o que sentimos também o é dependendo do momento! De facto, a TT tem sido a nossa "voz da consciência". Tens de escrever mais vezes...
Como posso eu dizer isto?
ESTE TEXTO ESTÁ FANTÁSTICO! Também sinto a maioria das coisas que aqui está e, sinceramente, não o conseguiria expressar melhor! Diria mesmo que está a melhorar a cada texto que escreve. E concordo com a FF... tem de escrever mais vezes!
Só uma coisa... As coisas são realmente mais fáceis através de um ecrã. É muito mais simples ter amigos que nos interpretam por palavras expressivas e com quem podemos ser o que sempre quisemos. Amigos que nunca nos desiludem, porque nunca esperamos nada deles além das letras! Na minha opinião não devemos trocar, NUNCA, um dia de sol, ou de chuva até, com amigos reais, amigos que sabem o que realmente somos e com quem só temos de nos limitar a ser nós próprios... por uma tarde em frente ao PC onde não podemos tocar a Natureza das árvores ou das pessoas em si. Pode dar “mais que fazer” do que carregar em teclas, mas sem dúvida que é essa essência que nos faz crescer e nos oferece experiencia e, claro, a poesia vital para viver.
olá MENINAS, como hei-de dizer isto?? Não caibo em mim de contente. Estou babada, inchada, vou explodir... :D
Sério, não pensei que este texto fosse interessante, quando muito divertido. Mas agora, a TT diz-me que ainda gosta mais que do outro?? WAW
E FF, como é que nós as duas, sendo tão quase opostas, nos feitios como na formação, somos tão parecidas?? Irmãs de letras?? hehe
OBRIGADA, sei que não foi por favor
tem uma maneria em que escreve e que toda a gente sente o que escreve dou lhe os parabens é muito importante se sentir bem. e pode dizer que tem AMIGOS eles muitas vezes estao mais aos nossos lados do que as pessoas que somos capazes de estar todo o dia.
Agradeço a visita ao meu blogue para começar. Concordo, com a entrada da internet nas nossas vidas a definição de amigo pode modificar um pouco, mas as pessoas com quem conversamos através de um ecrã, continuam a ser pessoas normais e talvez, ao vivo, as coisas fossem as mesmas. Também tenho a sorte de possuir boas amigas que fiz através destas modernices, mas também continuo a ter amigos na realidade, e embora seja um pouco diferente, trato-os como iguais, como meus amigos que são. Gostei muito do tema deste texto e da forma como foi desenvolvido. Virei mais vezes a este blogue tão interessante :)
bjs
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